sexta-feira, junho 13, 2014

O que representa uma agressão baixa, moral e psicológica, a uma mulher que já teve seu corpo violado por torturas reais físicas, e mesmo assim teve a dignidade de seguir em frente e dar as caras honestamente, numa continuada ação de patriotismo intrépido? Não precisam responder!


 Onde estavam os covardes?
por Florestan Fernandes Jr.
 
Onde estavam ontem os políticos que festejaram a escolha do Brasil como sede da Copa do Mundo de 2014? Onde estavam: Lula, Sérgio Cabral, Eduardo Campos, Aécio Neves, José Serra, Jaques Wagner, Yeda Crusius, Cid Gomes, Carlos Eduardo de Sousa Braga, Wilma de Faria, Roberto Requião, José Roberto Arruda, Blairo Maggi? Onde estava Marina Silva que queria uma sede no Estado dela, o Acre? Onde estavam os prefeitos, senadores, deputados, ancoras de televisão e rádio que queriam tanto a Copa do Mundo? Onde estavam os prefeitos e governadores responsáveis pelas obras exigidas pela Fifa? Ontem, coube a uma única mulher receber toda a agressão de uma torcida rica e privilegiada que conseguiu ingressos para o jogo de abertura em São Paulo. Uma elite raivosa que não perde a chance de destilar seu ódio de classe, seus preconceitos e sua falta de educação. Parabéns, presidenta Dilma, você não se escondeu nos palácios da República como fizeram os governadores, inclusive o senhor Geraldo Alckmin.

terça-feira, maio 27, 2014

"Se a imprensa cumprisse apenas o papel de identificar interesses e contextos de forma honesta já estaria prestando um serviço inestimável ao cidadão, que poderia ter elementos minimamente confiáveis para tomar decisões. Os jornais, revistas, telejornais e sites noticiosos na Web não precisam se proclamar paradigmas da independência, isenção e imparcialidade. Todos sabemos que isso é materialmente impossível. Mas se procurassem, pelo menos, chegar perto da isenção, isto já seria um antídoto poderoso contra a desinformação e deformação informativa."

A agenda alienante da imprensa

Por Carlos Castilho em 20/05/2014
 

Se alguém parar um minuto para pensar, se dará conta que a agenda de temas que a imprensa nos impõe é paranoica e desvinculada da realidade em que vivemos. Somos levados a discutir sobre temas que não têm impacto direto sobre o nosso quotidiano enquanto aqueles que realmente importam são mencionados superficialmente ou simplesmente esquecidos.
Pior do que isso, nós jornalistas induzimos o público a depender de decisões superiores quando boa parte dos problemas diários podem ser resolvidos, coletiva e colaborativamente, pelos próprios interessados. Alimentar a dependência é uma forma de subordinar as pessoas e ao mesmo tempo nutrir a onipotência de governantes.
Quem se preocupa em ir um pouco além das manchetes de jornais e revistas verá que os grandes problemas da população não são a CPI da Petrobras, se o José Dirceu vai ou não poder trabalhar fora da cadeia, se a presidente Dilma Rousseff sobe ou desce nas pesquisas etc., etc. O que nos tira o sono é o espectro da falta d’água, de uma previsível crise no abastecimento de energia elétrica, o quebra-cabeças da mobilidade urbana e o que fazer para termos direito aos serviços pelos quais pagamos impostos.
Esses são apenas alguns dos assuntos sobre os quais já deveríamos estar pensando, mas movidos por uma agenda noticiosa que leva em conta apenas o que é importante para os governantes de turno e os grandes empresários, acabamos deixando para depois, na expectativa de que os políticos e empreendedores operem o milagre impossível de resolver todos os nossos problemas. Trocamos a nossa omissão por votos na esperança de que eles tragam a solução que nunca vem.
Se a nossa imprensa quisesse, já teria como colocar o debate sobre a questão da energia tomando, por exemplo, o caso da Alemanha, onde 87% da produção de energia renovável estão nas mãos de indivíduos ou movimentos comunitários. Os especialistas em energia estão cansados de saber que o modelo concentrado em poucas megausinas não tem mais como crescer e que a descentralização é a única forma de criar sistemas sustentáveis que, operando em rede, podem resolver rapidamente eventuais falhas de unidades isoladas.
Megacidades como São Paulo já são inadministráveis porque a gestão municipal está toda concentrada na prefeitura, cujo orçamento e efetivo humano estão muito aquém das necessidades da população. Mas ninguém discute a descentralização porque isso não interessa ao prefeito de plantão e nem aos seus adversários, que esperam apenas a chance de tomar o poder, para que tudo continue igual.
Decisões como essas dificilmente serão tomadas pelos administradores atuais porque elas implicam quebrar modelos e rotinas, coisa que os políticos têm horror dado o risco de perder votos em futuras eleições. Nenhuma dessas decisões será tomada sem que a população tome consciência de sua necessidade e urgência. E esta consciência só pode ser alimentada por informações.
A imprensa seria a única instância à qual o cidadão poderia recorrer para obter dados sobre a situação de sua cidade, porque as demais instituições, inclusive a universidade, têm seus interesses próprios e tratam de defendê-los na mídia. O papel da imprensa seria propor temas que afetam a comunidade e identificar os interesses, abertos e ocultos, dos diferentes setores envolvidos em cada problema em debate. É o que o cidadão espera, mas não é o que ele obtém. O que assistimos hoje é a população levantar os problemas nas ruas e só depois disso é que a imprensa, políticos e governantes correm atrás – não para resolver, mas para livrar a própria responsabilidade, jogando preferencialmente a culpa nos desafetos.
Se a imprensa cumprisse apenas o papel de identificar interesses e contextos de forma honesta já estaria prestando um serviço inestimável ao cidadão, que poderia ter elementos minimamente confiáveis para tomar decisões. Os jornais, revistas, telejornais e sites noticiosos na Web não precisam se proclamar paradigmas da independência, isenção e imparcialidade. Todos sabemos que isso é materialmente impossível. Mas se procurassem, pelo menos, chegar perto da isenção, isto já seria um antídoto poderoso contra a desinformação e deformação informativa.
O cidadão é forçado a engolir maciças doses diárias de violência, tragédias e crimes cuja divulgação ocupa espaços que poderiam ser usados para a busca de soluções de problemas que estão na porta da casa de cada um de nós. Nada contra a divulgação do incêndio do ônibus que matou 34 crianças no interior da Colômbia, das enchentes na Sérvia ou da cabeça de bebê encontrada decapitada em Caxias do Sul (RS).
Mas os editores de jornais e telejornais precisam ter uma noção mais precisa daquilo que afeta ou vai afetar o quotidiano das comunidades onde está a sua clientela de usuários. Claro que é mais fácil reproduzir a notícia de uma tragédia distante que já vem formatada para o vídeo ou basta copiar e colar na página impressa.Investigar temas locais dá trabalho, toma tempo e mexe com interesses de pessoas que em geral estão muito próximas do jornal ou emissora.
A valorização da periferia é um fenômeno global que veio para ficar porque dele depende a sustentabilidade econômica e social do planeta. A imprensa ignora olimpicamente o que ocorre na periferia de nossas cidades e só acorda quando acontece alguma tragédia. Os empresários e economistas já fizeram as contas, muito antes dos políticos e administradores, e começaram a migração para a periferia e para o interior, onde os custos são menores e a qualidade de vida, muito melhor.
Mas a imprensa continua aferrada a um patriarcalismo político baseado em promessas eleitorais impossíveis de cumprir, atitude que mantém os cidadãos domesticados na esperança de que algo vá acontecer. Só que este modelo de jornalismo está se desgastando rapidamente e, se não for revisto no curtíssimo prazo, a própria sobrevivência de muitos veículos de comunicação estará ameaçada. 


quarta-feira, maio 07, 2014

abaixo, o texto de meu amigo Dimitri...
Muito inspirado sobre o cotidiano e as respostas para as perguntas que, às vezes até inconscientes, buscamos. Muito legal!

https://www.facebook.com/dimitribsn/posts/10152410469535070

terça-feira, abril 15, 2014

Espera

Espera
Carlos Wagner
A espera rara árdua...
Arde na retina, retidas vezes,
repetindo insolências, indolências, antes, entes desfigurados
nas figuras desenhadas no assoalho da casa em pó.

Ia indo inda que lento, lenta a mente, quase viva,
a escutar movimentos e sons das cores de tudo o que é forma,
tudo que informa intenções, algumas ao acaso.

Prezo os prazos mormente com aparente indicação de contradição,
contra indignação, apontada com dedos tortos de mãos mais tortas ainda,
indicando tortos perfis de gente duvidosa, de duvidosos critérios,
e ouço o impregnado som de imprecações, pois árdua e rara é a espera.

Ardentes beijos da impaciência do tempo, passando com pressa,
cessando os fios inertes de energia que falta...pra tudo.
Para tudo!

A espera é árdua,
pois são já muitos rodeios e pirulitagens, vida afora,
adentrando anos a fio, curtos pavios de vidas de Sísifos, pedra rolante,
vagabundas vivências ricas de tudo o que não tem valor nem preço,
peço e despeço-me de minhas obrigações triviais de vida burguesa,
paupérrimas economias de valores éticos e morais,
beirados por quase condutas...duvidosas, sem conteúdo original.

Árdua espera,
esfera de vida cambiante em que, adiante, sigo sempre, para, ao fim,
e olhar no espelho, o inconsciente revelado,
fotografias de minhas rotas otárias,
seguidas mesmices de uma direção em círculo... vicioso...até quando?

Oh árdua espera!
Carlos Wagner

domingo, abril 13, 2014


sábado, maio 07, 2011

Republicando

Pois me esqueci no dia de seu niver....!

Mãe...

Carlos Wagner 07/05/2011

Mãe, mater, mother, matriz de mim, meu jardim
minha cultura, onde brotei e cresci simples
pelas correrias da infância, pelas travessuras,
pelas agruras e ânsias de ver tudo indo bem...
Mãe, meu porto seguro, ouro outro que me dobrava,
me domava e me amava. 
Projetava em mim um homem menino,
voando por entre as cortinas de nossas histórias
acreditando em mim, mesmo quando intuía falsas falas
fiadas unhas de um gato medroso
olhando o mundo e achando-se poeta, na inocência de um não saber nada.
Mãe, seu dia é uma vida, construído em luta otimista.
Mãe, te quero grande no espírito da vida,
vivida com força de índia guerreira.
A saudade é um poema seu sobre o amor.
A saudade é um pouco de lembrança que entorna de mim,
e em torno de nós fica o olhar de órfãos que se encontram,
certos de que tudo foi bom,
foi muito bom!!!

Carlos Wagner

segunda-feira, abril 07, 2014

Breno Altman: Quando a democracia comporta linchamento jurídico

publicado em 24 de março de 2014 às 5:09
Abominável silêncio sobre o caso José Dirceu
Por Breno Altman, na Folha, sugerido pelo autor
Um espectro ronda a vida institucional e jurídica do país, movimentando-se na calada da sociedade e do Estado. Seus contornos podem ser definidos por uma pergunta: a democracia comporta o linchamento midiático e processual como ferramenta para eliminar inimigos políticos?
A questão leva nome e sobrenome. Há mais de quatro meses o ex-ministro José Dirceu de Oliveira e Silva cumpre pena em regime fechado, mesmo tendo sido condenado ao cumprimento inicial em sistema semiaberto. O presidente do STF, com a cumplicidade do juiz encarregado da execução penal, pisoteia ou posterga decisões da própria corte.
Não importa, a esses senhores e seus aliados, que a essência da acusação contra o líder petista tenha sido esvaziada pela absolvição acerca da formação de quadrilha. Afinal, sentenciado sem provas materiais ou testemunhais, Dirceu teve sua culpa determinada por uma teoria que considerava suficiente a função que eventualmente exercera no comando de suposto bando criminoso, cuja existência não é mais reconhecida.
O grupo chefiado pelo ministro Joaquim Barbosa, no entanto, resolveu virar as costas para a soberania da instituição que preside. Sob pretexto de regalias e privilégios que jamais se comprovam, mas emergem como verdadeiros nas páginas de jornais e revistas, a José Dirceu se nega o mais comezinho dos direitos. Permanece preso de forma ilegal, dia após dia, em processo no qual a justiça se vê substituída pela vingança.
Há poucos paralelos na história posterior à redemocratização, revelando o poderio dos setores mais conservadores e autoritários quase três décadas depois de findada a ditadura dos generais. As irregularidades contra Dirceu, acima de problema humanitário, afetam pilares fundamentais do regime democrático e civilizado.
O mais triste e preocupante, porém, é a omissão do mundo político diante da barbaridade. Vozes representativas do Estado e da sociedade fazem opção pela abulia e a passividade, possivelmente, e de antemão, atemorizadas pela reação de alguns veículos de comunicação e o dano de imagem que poderiam provocar contra quem ousasse dissentir.
O protesto cresce entre cidadãos e ativistas, alcança o universo jurídico, recebe acolhida de alguns articulistas e chega a provocar certo nível de resposta nos partidos e organizações progressistas. Mas a ilegalidade, respaldada por boa parte da mídia tradicional, não é enfrentada à altura por autoridades governamentais e entidades cujo papel obrigatório na defesa dos direitos democráticos deveria impor outro comportamento.
O mutismo refugia-se em álibis como a independência entre poderes e o caráter terminal da sentença promulgada pelo STF. Como se o bem supremo a ser defendido não fosse a Constituição, mas o respeito ritualístico a uma instância na qual se formou maioria transitória a favor do arbítrio.
Outra camuflagem aparece sob a forma de abordagem unilateral ao que vem a ser liberdade de imprensa. Como se empresas jornalísticas estivessem acima das normas e do escrutínio da cidadania. Ou é aceitável que responsáveis pela coisa pública abdiquem da crítica frontal quando meios de comunicação violam conduta para destruir reputações e prerrogativas inscritas em lei?
Estes são, enfim, temas da democracia, não apenas da solidariedade a José Dirceu ou da jurisdição de petistas que lhe são leais. O silêncio sobre o caso é tão abominável quanto aquele que, no passado, franqueou decisões do STF entregando Olga Benário ao nazismo ou chancelando o golpe militar de 1964.
Breno Altman, 52, é diretor editorial do site Opera Mundi.
Leia também: 
Altamiro Borges: Por incrível que pareça, Arruda está de volta
http://www.addthis.com/bookmark.php?v=250&pubid=xa-4dc007425431fb12

Os direitos de José Dirceu e o caráter do brasileiro
Texto da Istoé
 

Numa injustiça clamorosa que vai além de qualquer opinião sobre as ideias de José Dirceu, seus direitos como prisioneiro não são respeitados

Há momentos em que a vida política deixa de ser um conflito de ideias e projetos para se transformar numa prova de caráter.

Isso é o que acontece com a perseguição a José Dirceu na prisão.

A defesa dos direitos de Dirceu é, hoje, uma linha que define o limite da nossa decência, ajuda a mostrar aonde se encontra a democracia e o abuso, a tolerância diante do ataque aos direitos elementares de uma pessoa.

Ninguém  precisa estar convencido de que Dirceu é inocente sobre as denuncias da AP 470. Nem precisa concordar com qualquer uma de suas ideias políticas para reconhecer que ele enfrenta uma situação  inaceitável.

As questões de caráter envolvem nossos princípios e nossa formação. Definem a  capacidade de homens e mulheres para reagir diante de uma injustiça de acordo com princípios e valores aprendidos em casa, na escola, ao longo da vida,  como explica  Hanna Arendt  em Origens do Totalitarismo. São essas pessoas que, muitas vezes, ajudam a democracia a enfrentar as tentações de uma ditadura.

Um desses homens, e nós vamos saber seu nome dentro de alguns parágrafos, “não era herói e certamente não era um mártir. Era apenas aquele tipo de cidadão com interesse normal pelos negócios públicos que, na hora do perigo ( mas não um minuto antes) se ergue para defender o país da mesma forma como cumpre seus deveres diários, sem discutir.”

A mais recente iniciativa contra os direitos de Dirceu criou um situação nova.

O Ministério Público pede uma investigação telefônica-monstro envolvendo todas as ligações de celular – de 6 operadoras — entre a região do presídio da Papuda, em Brasília, onde ele se encontra prisioneiro desde 16 de novembro, e uma região em torno de Salvador, na Bahia. São milhares, quem sabe milhões de ligações que devem ser mapeadas, uma a uma, e transcritas – em formato de texto – para exame do ministério público em Brasília.

Você sabe qual é o motivo alegado dessa investigação: procurar rastros de uma conversa de celular entre Dirceu e um secretário do governo de Jaques Wagner. Detalhe: supõe-se que o telefonema, caso tenha sido feito, teria ocorrido em 6 de janeiro. Pede-se uma investigação de todas as conversas por um período de 16 dias.

Você sabe qual será seu efeito prático: manter a pressão sobre Dirceu e impedir que ele possa deixar o presídio para trabalhar durante o dia – direito que tem todas as condições legais de cumprir. Não só obteve uma oferta de emprego, como tem parecer Psicossocial favorável e também do Ministério Púbico.

Você pode “achar” – assim como “achamos” tantas coisas a respeito de tantas pessoas, não é mesmo? – que ele cometeu, mesmo, essa falta disciplinar, de natureza grave.

O fato é que desde 6 de janeiro procura-se uma prova desse diálogo  e nada. O secretário de Estado deu uma  entrevista a Folha de S. Paulo, dizendo que havia conversado com Dirceu. Mais tarde, ele se corrigiu e  desmentiu o diálogo. Também confirmou o desmentido  em depoimento oficial. Dirceu sempre negou ter mantido qualquer conversa nestas ocndições.

A conta telefônica do celular do Secretário de Estado não registra nenhuma ligação que, em tese, poderia confirmar a conversa. Uma investigação da policia do Distrito Federal também concluiu que não há o mais leve indício de que o diálogo tenha ocorrido.

Conforme todos os indícios disponíveis, portanto, quem mentiu foi  o  Secretário – não Dirceu.

Você pode continuar duvidando da inocência de Dirceu, claro. Mas não pode aceitar que seus direitos sejam subtraídos sem que sua culpa seja demonstrada. Mesmo na prisão, uma pessoa é inocente até que se prove o contrário. 

É verdade que, no julgamento da AP 470, o ministro Luiz Fux chegou a dizer que cabe ao acusado provar sua inocência. Mas foi uma colocação tão fora de qualquer princípio jurídico posterior ao iluminismo que, nos acórdãos, a declaração foi suprimida.

O pedido para esse grampo-monstro foi feito pelo Ministério Público  em 26 de fevereiro mas ficou engavetado pelo juiz Bruno Ribeiro por mais de um mês. Quando se retirou do caso, no fim de março, Bruno enviou o pedido  a Joaquim Barbosa, a quem caberá a palavra final sobre o semiaberto de Dirceu. Joaquim pode acolher o pedido.

Mas também pode manter Dirceu em regime fechado enquanto aguarda pelos grampos Papuda-Bahia. Seria uma nova injustiça, mesmo para quem é favorável a uma investigação nessa natureza e acha que toda punição a Dirceu será pouca.

A liberdade de Dirceu não pode ser diminuída  porque os responsáveis pela sua prisão levaram um tempo absurdo– mais de um mês – para decidir se acatavam a solicitação ou não.

Ninguém pode ficar preso indevidamente porque o Justiça está “pensando.”

Quando foi preso, em 15 de novembro, Dirceu tinha direito ao regime semiaberto, provisoriamente. Antes que os embargos infringentes tivessem sido julgados, havia a possiblidade de que o Supremo confirmasse a condenação por formação de quadrilha.

Mas o STF derrubou a condenação, o que confirmou o semiaberto.

Assim, do ponto de vista de seus direitos,  Dirceu perdeu perdeu quatro mees de liberdade.  

Se o apreço abstrato do caro leitor pela liberdade dos indivíduos não lhe permite avaliar o que isso significa, sugiro uma experiência concreta.

Peça a um amigo trancar a porta de seu quarto por um dia e faça um diário sobre o que fez e viu. Evite ligar a TV, porque ela só é autorizada a quem tem bom comportamento – e ninguém sabe se você merece isso.  Não leia jornais nem revistas. Limite a leitura aos livros mas apague a luz às 22 horas.  Desligue o telefone, não atenda a campainha e, se sentir fome, peça  um resto de geladeira para aquecer em banho-maria. Pode ser qualquer coisa que sobrou da véspera mas lembre-se de que, comparado com o que se oferece na Papuda, sempre será um privilégio.

E se você achar que é inocente, e não fez nada para merecer o que está acontecendo, só quis passar por uma experiência existencial, lembre-se: esse pensamento só é válido para quem acredita que toda pessoa é inocente até que se prove o contrário. Esse é o princípio que garante nossa liberdade.

Também é o princípio que deveria definir a situação de Dirceu. Ele passou oito anos sendo acusado como chefe de quadrilha e era este ponto – a quadrilha – que poderia manter seu regime fechado.

Depois que a acusação de quadrilha caiu ele é chefe de que mesmo?

E aí podemos falar do personagem a que Hanna Arendt se refere. Ela está falando de George Picquard, major do Exército francês, que teve um papel decisivo no reestabelecimento da verdade no caso do capitão Alfred Dreyfus, condenado em 1894 à prisão perpétua na Ilha do Diabo, na Guiana Francesa, com bom base em provas falsas.

“Embora dotado de uma boa formação católica,” e, como Arendt sublinha para registrar os preconceitos da época, “  ‘adequada’ antipatia pelos judeus, ele ainda não havia adotado o princípio de que o fim justifica os meios. ” Ela recorda que “esse homem, completamente divorciado do classicismo social e da ambição profissional, espírito simples, calmo e politicamente desinteressado” iria mostrar que havia encontrado provas que apontavam para outro culpado, sugerindo que o caso fosse reaberto.

Picquard acabou processado e perseguido, a ponto de enfrentar uma condenação num tribunal militar e deixar um posto confortável em Paris por um posto sem perspectiva na África colonial. Mas cinco anos depois de condenado, Dreyfus acabou recebendo indulto presidencial, depois de enfrentar um segundo julgamento – que perdeu,  mais uma vez.

A campanha pela libertação de Dreyfus não passou pelo parlamento, que rejeitou seguidos pedidos de um novo exame do caso. Foi fruto de uma movimentação da sociedade civil, a margem dos principais partidos políticos.

Mesmo os socialistas temiam perder votos se colocassem o assunto nos debates eleitorais. Atribui-se uma derrota de um de seus líderes históricos, Jean-Jaurés, hoje nome de boulevard em Paris, ao empenho a favor de Dreyfus. Ninguém recorda o nome dos que se omitiram.

O alto comando militar, responsável pela condenação de Dreyfus e, mais tarde, pela manutenção da farsa, alimentava a imprensa suja de Paris.  Numa avaliação  que nos ajuda a entender que a realidade que hoje se vê nos trópicos brasileiros tem muito a dever às asneiras cometidas na capital francesa daquele tempo, Arendt  analisa o mais duro dos jornais contra Dreyfus  para dizer: “direta ou indiretamente, através de seus artigos e da intervenção pessoal de editores, mobilizou estudantes, monarquistas, anarquistas, aventureiros e simples bandidos, e atirou-os nas ruas.” Essa turba espancava defensores de Dreyfus na rua e por várias vezes apedrejou as janelas de Emile Zola depois de seus artigos e conferencias mais contundentes.

Julgado pelo Eu Acuso, Zola recebeu pena máxima. Foi um alivio, pois se fosse absolvido “nenhum de nós sairia vivo do julgamento” recordou Georges Clemenceau, dono do jornal que publicou o artigo, L ‘Aurore.

Em 1975, em São Paulo, o rabino Henry Sobel  deu uma demonstração de caráter semelhante. Ele sequer era o rabino principal da comunidade paulistana. Apenas substituía o rabino principal, que se encontrava em viagem. Norte-americano de nascimento, Sobel admirava John Kennedy e nunca teve simpatias pelo Partido Comunista.

Mas, quando foi informado que o  corpo do jornalista Vladimir Herzog apresentava sinais de tortura, como fora percebido pelos funcionários do cemitério judeu que o preparavam para o enterro, Sobel tomou uma decisão de acordo com sua formação e suas convicções.

Impediu que Herzog fosse enterrado na área do cemitério reservada aos suicidas, como seria coerente com a versão oficial para a morte do jornalista – acompanhada até por uma fotografia forjada na cadeia – para lhe dar a dignidade de um enterro comum. O resto é história, feita por um cidadão tão humano, tão comum, que mais tarde seria apanhado num pequeno e desagradável incidente num shopping em Miami, como todos nós sabemos.

Em tempo: Conversa Afiada publica vídeo indicado pelo infatigável Stanley Burburinho:

Um grupo da Juventude do PT do DF, anteontem, estava no bar Chopin na 406 sul, na Asa Sul no DF, quando chegou Joaquim Barbosa, presidente do STF. O grupo desceu e começou a se manifestar contra ele gritando: “Dirceu, guerreiro, do povo brasileiro”: 
/Dica @LeltonMelo


Clique aqui para ler “Dirceu deve escancarar a Ditadura da Toga”. 
aqui para ler “Tortura: Juiz e Barbosa negam trabalho a Dirceu”.


segunda-feira, março 31, 2014

Mordaça
Eduardo Gudin

TUDO O QUE MAIS NOS UNIU SEPAROU
TODO O QUE TUDO EXIGIU RENEGOU
DA MESMA FORMA QUE QUIS RECUSOU
O QUE TORNA ESSA LUTA IMPOSSÍVEL E PASSIVA

O MESMO ALENTO QUE NOS CONDUZIU DEBANDOU
TUDO O QUE TUDO ASSUMIU DESANDOU
TUDO QUE SE CONSTRUIU DESABOU
O QUE FAZ INVENCÍVEL A AÇÃO NEGATIVA

É PROVÁVEL QUE O TEMPO FAÇA A ILUSÃO RECUAR
POIS TUDO É INSTÁVEL E IRREGULAR
E DE REPENTE O FUROR VOLTA
O INTERIOR TODO SE REVOLTA
E FAZ NOSSA FORÇA SE AGIGANTAR

MAS SÓ SE A VIDA FLUIR SEM SE OPOR
MAS SÓ SE O TEMPO SEGUIR SEM SE IMPOR
MAS SÓ SE FOR SEJA LÁ COMO FOR
O IMPORTANTE É QUE A NOSSA EMOÇÃO SOBREVIVA

E A FELICIDADE AMORDACE ESSA DOR SECULAR
POIS TUDO NO FUNDO É TÃO SINGULAR
É RESISTIR AO INEXORÁVEL
O CORAÇÃO FICA INSUPERÁVEL
E PODE EM VIDA IMORTALIZAR



Composição: Eduardo Gudin/Paulo Cesar Pinheiro

http://jornalggn.com.br/blog/sergio-saraiva/a-folha-e-a-tentativa-de-fuga-de-um-jornal-em-conflito-com-o-seu-passado

A Folha e a tentativa de fuga de um jornal em conflito com o seu passado

“Hoje sinto a mesma dor, talvez menos que você, e... E depois do que eu disser, me perdoa se quiser, mas... Finge que está tudo bem. Minta pra mim pra que eu viva meu sonho feliz assim”.
São extratos da doída e bela canção de Jorge Aragão – “Minta meu sonho”.
É nesse campo, o do autoengano, que devemos entender o editorial de domingo, 30/03/2014, véspera dos 50 anos do golpe de 1964. Aliás, é esse o título seco do editorial “1964”.
Soa acaciano dizer que só pode se fazer afirmações sobre o que ocorreu. Tais afirmações poderiam ser verdadeiras ou falsas, mas se apoiariam em fatos. Sobre o que não aconteceu, porém, pode se criar suposições, teorias até bem elaboradas ou simples ilusões. Pode se criar mitos. É desse material onírico que a Folha de São Paulo tenta se valer para relativizar a ruptura democrática de 1964, o golpe que derrubou um presidente democraticamente eleito, e os crimes lesa-humanidade que se seguiram a ela, com a aparente pretensão de relativizar sua própria participação em tais atos.
“Aquela foi uma era de feroz confronto entre dois modelos de sociedade --o socialismo revolucionário e a economia de mercado. Polarizadas, as forças engajadas em cada lado sabotavam as fórmulas intermediárias e a própria confiança na solução pacífica das divergências, essencial à democracia representativa.” Diz o editorial.
Não, tal qual como hoje, a esquerda no Brasil havia chegado ao poder por vias democráticas, não revolucionarias. Tal qual como hoje, tímidas mudanças de quebra do monopólio da plutocracia sobre as riquezas da nação ensejaram uma reação autoritária e golpista como forma de manutenção do establishment conservadorTal qual como hojea Folha estava alinhada a essas forças reacionárias.
“Logo após 1964, quando a ditadura ainda se continha em certas balizas, grupos militarizados desencadearam uma luta armada dedicada a instalar, precisamente como eram acusados pelos adversários, uma ditadura comunista no país”.
Mais uma vez a impostura de dar o status de “forças beligerantes” para um pequeno grupo de resistentes radicalizados, sem a menor condição prática de se opor a um golpe patrocinado pela burguesia, empresariado, Igreja, grande imprensa, Forças Armadas e pelos Estados Unidos. Só o povo não estava presente, nem foi convidado. Bastaria a Folha ter lido “A ditadura envergonhada” e “A ditadura escancarada”, dois livros de uma série de seu jornalista Elio Gaspari, para perceber a impropriedade de tal argumento, dada a imensa disparidade de recursos.  Elio nota que os guerrilheiros do Araguaia, movimento posterior ao de Caparaó, que parece ser o citado pela Folha, não possuíam sequer uma “arma longa”, revólveres tão somente. Quase flores enfrentando canhões. Caparaó mesmo não passava de algo em torno de vinte homens.
Como então afirmar “As responsabilidades pela espiral de violência se distribuem, assim, pelos dois extremos,...”?
Igualmente é a defesa que a Folha faz a seguir dos êxitos econômicos da ditadura:
“Em 20 anos, a economia cresceu três vezes e meia. O produto nacional per capita mais que dobrou. A infraestrutura de transportes e comunicações se ampliou e se modernizou. A inflação, na maior parte do tempo, manteve-se baixa”.
Ato falho, pois fez me lembrar do filme “Hitler”, propaganda da própria Folha que, referindo-se ao ditador nazista, começava por:
 “Este homem pegou uma nação destruída, recuperou sua economia e devolveu orgulho ao seu povo. Em seus quatro primeiros anos de governo o número de desempregados caiu de seis milhões para 900 mil pessoas. Este homem fez o PIB crescer 102% e a renda per capta dobrar... e reduziu uma hiperinflação a, no máximo, 25% ao ano”.
Para concluir: “É possível contar um monte de mentiras dizendo só a verdade”.
Até porque tal "exito" nos custou "duas décadas perdidas".
Por que a Folha pisaria o terreno pantanoso da revisão histórica? A resposta é freudiana. A Folha tenta rever a sua própria história:
“Às vezes se cobra, desta Folha, ter apoiado a ditadura durante a primeira metade de sua vigência, tornando-se um dos veículos mais críticos na metade seguinte. Não há dúvida de que, aos olhos de hoje, aquele apoio foi um erro”.
Sem dúvida, o julgamento moral de um ato deve levar em conta o lugar e o tempo onde o ato aconteceu. Ocorre que dessa atenuante a Folha não pode se socorrer. Já na década de 60, um golpe contra a democracia era algo inaceitável e já era crime contra a humanidade fazer da“tortura uma política clandestina de Estado”. Era isso que a Folha apoiava, na época. Com todo o conhecimento de quem, mais do que apoio ideológico, é acusada de prestar apoio material, na forma de empréstimos de viaturas, aos torturadores para o transporte dissimulado de suas vítimas. E acusada ainda do silêncio, quando não da propaganda, cúmplice e conveniente sobre tais crimes.
Portanto, soa como uma reação de defesa psicológica ao conflito entre os fatos e a imagem que a Folha quer cultivar de si própria, o seguinte parágrafo do editorial:
“É fácil, até pusilânime, porém, condenar agora os responsáveis pelas opções daqueles tempos, exercidas em condições tão mais adversas e angustiosas que as atuais. Agiram como lhes pareceu melhor ou inevitável naquelas circunstâncias”.
Não, não são os covardes que hoje condenam a Folha por “agir como lhe pareceu melhor naquela circunstância”, são os que sobreviveram. São, indiretamente, as suas vítimas.
E isso em momento algum deve lhes ser fácil.
Quanto à Folha, parece que ainda não reuniu forças para fazer o que propõem aos outros neste seu editorial, ou seja, o “longo e doloroso aprendizado para todos os que atuam no espaço público, até atingirem a atual maturidade no respeito comum às regras e na renúncia à violência como forma de lutar por ideias”.
Que não continue assim.

IMAGENS

segunda-feira, janeiro 27, 2014

Parir o real
Carlos Wagner
06/08/2013

Do nada, danças, talvez estranhas,
há muito toleradas dúvidas,
as crescentes esperas raras, raspadas a fundo, dominadas do nada saber,
erguidas e demolidas as barreiras rasteiras,
mesmo que impedindo dores,
espera-se que desvendem verdades de idades remotas,
tortas idéias estranhas,
mesmo que base de muitas reais montanhas povoadas,
miríades de vidas,
mesmo que exóticas,
mesmo que exógenas, 
mesmo que Eros de óticas confusas,
sábias canções de sabiás e melros,
maritacas e papaguenos, 
mesmo que arrítmicas melodias de dias melosos, 
mesmo que desvendadas de vendas invisíveis,
mesmo que doridas...
Do nada, datados episódios emergentes,
dos porões do in-conhecido,
infundado alicerce de solidez líquida,
lânguido motivo vivo,
vívido e truculento tranco nas bases ácidas de hidrovias subterrâneas, 
rios da vida,
ferventes águas do in-conhecível subsolo dos humanos esforços por serem gente humana – no sentido dos sonhos de Adão,
perdido, desviado, abatido e buscador.
Dor, sim, dor do parto a parir.

Carlos Wagner

domingo, janeiro 05, 2014

Como lidar com a adversidade segundo os filósofos estoicos

http://www.diariodocentrodomundo.com.br/como-lidar-com-a-adversidade-segundo-os-filosofos-estoicos/

terça-feira, novembro 26, 2013

Altamiro Borges: Barbosa e a face tenebrosa da maldade

Altamiro Borges: Barbosa e a face tenebrosa da maldade: Por Luis Nassif, no Jornal GGN : A disputa política permite toda sorte de retórica. Populistas, insensíveis, reacionários, porra-loucas...

sexta-feira, novembro 15, 2013

Ação Penal 470: uma exceção para a história



Não enxergo qualquer efeito pedagógico nesse julgamento e não desejo em hipótese alguma que se repita em outros processos futuros.

Ao bem afamado Péricles, o ateniense, é atribuída a opinião de que, embora sendo certo que nem todos têm sabedoria para governar, a capacidade de julgar um governo em particular é universal. A observação parece valer com razoável generalidade. Por exemplo: nem por faltar um diploma em medicina está um adoentado impedido de avaliar a competência do profissional que o assiste. Assim, ainda que não portador de títulos ou conhecimentos para ocupar assento no Supremo Tribunal Federal, tenho como direito constitucional e recomendação de um clássico grego inteira liberdade para opinar sobre a Ação Penal 470.

Posso dispensar a cautela de não me indispor com aquele colegiado, pois não tenho licença para advogar oficialmente ou não a causa de quem quer que seja. E contrariando desde logo o juízo de algumas pessoas de bem, não enxergo qualquer efeito pedagógico nesse julgamento e não desejo em hipótese alguma que se repita em outros processos. Falacioso em seu início, enredou os ministros em pencas de distingos argumentativos e notória fabricação de aleijados fundamentos jurídicos. Não menciono escandalosos equívocos de análise com que a vaidade de alguns e a impunidade de todos sacramentaram, pelo silêncio, o falso transformado em verdadeiro por conluio majoritário. Vou ao que me parece essencial.

A premissa maior da denúncia postulava a existência de um plano para a perpetuação no poder arquitetado por três ou quatro importantes personagens do Partido dos Trabalhadores. Até aí nada, pois é aspiração  absolutamente legítima de qualquer partido em uma ordem democrática. Não obstante, é também mais do que conhecido que o realismo político recomenda, antes de tudo, a busca da vitória na próxima eleição. Não existe a possibilidade logicamente legítima de extrair de uma competição singular, exceto por confissão dos envolvidos, a meta de perpetuação no poder de forma ilegal ou criminosa. Pois o procurador-geral da República pressupôs que havia um plano transcendente à próxima eleição, a ser executado mediante meios ilícitos.

A normal aspiração de continuidade foi denunciada como criminosa, denúncia a ser comprovada no decorrer do julgamento. E aí ocorreu essencial subversão na ordem das provas. Ao contrário de cada conjunto parcial de evidências apontar para a solidez da premissa era esta que atribuía a frágeis indícios e bisbilhotices levianas uma contundência e cristalinidade que não possuíam. Todos os ministros engoliram a pílula da premissa e passaram a discutir, às vezes pateticamente, a extensão de seus efeitos. Dizer que a mídia reacionária ajudou a criar a confusão, que, sim, o fez, não isenta nenhum dos ministros da facilidade com que caíram na armadilha arquitetada pelo procurador geral e pelo ministro relator Joaquim Barbosa.

Era patético, repito, o espetáculo em que cada ministro procurava nos textos legais quer a inocência, quer a culpabilidade dos acusados. Em momentos, fatos que eram apresentados por um ministro como tendo certa significação, derivada da premissa, e por isso condenava o acusado pelo crime supostamente cometido, os mesmos fatos eram apresentados como significando o oposto e, todavia, servindo de comprovação da culpabilidade do acusado. Exemplo: a ministra Carmem Lucia entendeu que o fato de a mulher de João Paulo Cunha ter ido descontar ou receber um cheque em gerência bancária no centro de Brasília comprovava a tranqüilidade com que os acusados cumpriam atos criminosos à luz do dia, desafiadoramente. Já a ministra Rosa Weber interpretou o mesmo fato como uma tentativa de esconder uma ação ilegal e, portanto, João Paulo Cunha, seu marido, era culpado. Uma ação perfeitamente legal, note-se, o desconto de um  cheque, sofreu dupla operação plástica: uma transformou-o em deboche à opinião pública, outra o encapotou como um pioneiro ato blackbloc. Dessas interpretações contraditórias, seguiu-se a mesma conclusão condenatória, pela intermediação da premissa maior, segundo a qual qualquer ato dos indiciados estava associado àquele desígnio criminoso.

Estando os acusados condenados conforme tal rito subversivo, o julgamento de outras acusações (sendo o julgamento “fatiado” como bem arquitetou o relator Joaquim Barbosa, enfiando-o aos gritos pela goela de nove dos 11 ministros) se iniciava assim: tendo ficado provado que o réu cometeu tal e tal crime, lá se ia nova acusação como se se tratasse de um reincidente no mundo do crime em momentos diferentes no tempo. E mais, como se a condenação já estabelecida houvesse confirmado a veracidade da premissa maior sobre a existência de um plano político maligno. Pois assim foi até o fim: a premissa caucionando indícios frágeis – e até mesmo a total ausência de indícios como na fala da ministra Rosa Weber explicando que aceitava a culpabilidade de José Dirceu justamente pela inexistência de provas – e os indícios frágeis, convertidos em condenações, emprestando solidez a uma estapafúrdia premissa.

Foi igualmente lamentável o espetáculo da dosimetria. Como calcular penas segundo a extensão e intensidade do agravo, se a existência do agravo pendia de farrapos de indícios? E como calcular se o que sustentava os indícios era uma conjetura dialeticamente tornada plausível por esses farrapos e para a qual não há pena explícita consignada?

Todos os ilícitos comprovados, e vários o foram, se esclarecem e adquirem sentido terreno quando se aceita o crime confesso de criação e utilização de caixa dois.

Esta outra acusação foi desvirtuada pela mídia e pelos ressentidos de derrotas eleitorais, apresentando-a como tentativa de inocentar militantes políticos.

Notoriamente, buscou-se punir de qualquer modo os principais nomes do Partido dos Trabalhadores. A seguir, sucederam-se os contorcionismos para a montagem de um roteiro em que se busca provar o inexistente.

Não há nada a copiar neste julgamento de exceção – a Ação Penal 470.

Wanderley Guilherme dos Santos
No Carta Maior

segunda-feira, outubro 28, 2013

http://letras.mus.br/los-hermanos/230955
Http://letra.mus.br/los-Hermanos/230955
Primeiro andar
Rodrigo Amarante 
Já vou, será
Eu quero ver
O mundo, eu sei
Não é esse lá
Por onde andar
Eu começo por onde a estrada vai
E não culpo a cidade, o pai
Vou lá, andar
E o que eu vou ver
Eu sei lá
Não faz disso esse drama essa dor
É que a sorte é preciso tirar pra ter
Perigo é eu me esconder em você
E quando eu vou voltar, quem vai saber
Se alguém numa curva me convidar
Eu vou lá
Que andar é reconhecer
Olhar
Eu preciso andar
Um caminho só
Vou buscar alguém
Que eu nem sei quem sou
Eu escrevo e te conto o que eu vi
E me mostro de lá pra você
Guarde um sonho bom pra mim
Eu preciso andar
Um caminho só
Vou buscar alguém
Que eu nem sei quem sou

terça-feira, outubro 15, 2013

Bolsa

- Associação Internacional de Seguridade Social - concede seu maior prêmio ao Bolsa Família; reconhecimentos ocorrem apenas de três em três anos; atacado no Brasil, programa foi julgado como "experiência excepcional e pioneira na redução da pobreza"; em entrevista coletiva no Ipea, nesta manhã, ministra do Desenvolvimento Social, Tereza Campello, afirma que "premiação internacional reconhece o esforço do país para construir uma rede de proteção social"; estudo inédito do instituto sobre o impacto da iniciativa na economia revela que se o Bolsa Família fosse extinto, a pobreza passaria de 3,6% para 4,9%; além disso, cada real gasto com o programa faz a economia girar 240%.


247 O governo não tem como não comemorar. Polêmico no Brasil, onde é alvo de ataques em razão de falhas pontuais e, também, pelo que é visto por muitos como 'caráter assistencialista', o programa Bolsa Família acaba de receber aquele que é considerado o prêmio Nobel da seguridade social.
Trata-se do Award for Outstanding Achievement in Social Security, concedido pela Associação Internacional de Seguridade Social. Com sede na Suíça, essa entidade foi fundada em 1927 e é reconhecida por 157 países e 330 organizações não governamentais. O grande prêmio, concedido depois de uma série de pesquisas in loco, só é concedido a cada três anos.
O Bolsa Família, que está completando 10 anos de existência no atual formato, foi considerado pela ISSA como "uma experiência excepcional e pioneira na redução da pobreza e na promoção da seguridade social". 

sábado, outubro 12, 2013

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Nuno Ramos
Arquivo "Última Hora"


ACHO QUE NUNCA TORCI TANTO POR UM JOGADOR COMO TORCI POR REINALDO; TUDO EM SEU FUTEBOL ERA LINHA E CLARIDADE


Foi a primeira vez que reparei nele. Hoje lembro pouco, mas acho que foi contra a Iugoslávia, talvez em 1977, num amistoso da seleção em que (isso eu tenho certeza) ele estreava. Um clássico: a matada no peito, o chapéu no zagueiro e o chute no ângulo, sem que a bola picasse. Nada indicava esforço, tensão muscular ou grandes gestos, apenas uma grandeza serena e quase anônima de um semi-adolescente que ninguém conhecia ainda. Foi a primeira vez que confirmei aquilo que um rumor, vindo lá do campeonato mineiro, anunciava há algum tempo: um fora-de-série aparecia. Foi, também, uma das únicas vezes em que o vi jogar sem que estivesse machucado, sem precisar consultar aquele estranho gabarito que sempre o acompanhou: imagine o que faria com quatro meniscos.
Acho que nunca torci tanto por um jogador como torci por Reinaldo. Tudo em seu futebol era linha e claridade. Os dribles eram desconcertantes, mas nunca naquele sentido esfuziante, Denílson do termo. Eram de algum modo compostos, quase sóbrios, estranhamente lentos e sempre em direção ao gol.
Batia com as duas, mas seus chutes pareciam mais colocados do que fortes, como se resultassem de um cálculo preciso. O importante é que nada fosse desperdiçado. Havia uma espécie de nitidez intelectual no que fazia, extremamente rara num centroavante (apropriada, talvez, a um camisa 10), e que outro mineiro, o centroavante-armador Tostão, provavelmente inaugurara nessa posição.
Mas, acima de tudo, quem torcia por Reinaldo torcia pela fluência, pela facilidade, pelo modo desobstruído de vencer os zagueiros. A essa força construtiva -como um eleito a quem não pesassem os buracos da grama, a velocidade da bola, o calor do sol, as botinadas dos zagueiros-, a essa coesão clássica que seu primeiro gol na seleção definiu e batizou, opunha-se uma outra força, vinda das profundezas mais remotas, que está para o futebol um pouco como a morte está para a vida: aquela que vem das contusões.
Não lembro de outro jogador que tenha sido acompanhado tão constante e profundamente, e desde o início da carreira, por esse demônio lento infiltrado no joelho, na panturrilha, nas cartilagens das juntas. É através das contusões que o corpo do jogador, desobrigado de suas habilidades, retorna à generalidade de ser um corpo, um corpo qualquer e então manca e sente pontadas e não pode nem sequer apoiar o pé no chão. Reinaldo, provavelmente o mais sofisticado jogador de sua época (ainda mais do que Zico), teve sempre perto de si esse fantasma, que lhe roubava a especialização e a mágica. Por isso, torcer por ele, de alguma forma, era reparar uma injustiça, era torcer contra aquilo que não tem nome -doença, praga, morte.
Nuno Ramos é artista plástico e escritor, autor de "Cujo" e "O Pão do Corvo" (ambos pela editora 34).


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