terça-feira, setembro 13, 2011

Texto lúcido


Marcelo Carneiro da Cunha
De São Paulo
Estimadíssimos milhares de leitores, cá estamos, à véspera do 11 de setembro de 2011, dez anos desde então.
Espero que vocês não saibam, mas eu estava lá. Eu faço que esqueço, mas estava, e nessas datas jornais sempre descobrem que eu estava lá e acabo falando a respeito, e falo em respeito ao dia e às vítimas, e em respeito ao direito que as pessoas têm de saber o que aconteceu naquele dia, mesmo que o que eu saiba seja pouco e nada mais ou melhor do que o que todos sabem. Saber é uma coisa, caros leitores, e viver é outra. Saber, todos sabemos. Viver, eu vivi, e preferia não ter vivido, simples assim.
Porque dói demais, estimados leitores. Estou aqui escrevendo e fazendo beiço e sorte a minha terrível avó Jovita não estar por perto, porque então eu ia ver só. Homem não fazia beiço, no mundo da minha avó. Acho que homens também não pegavam aviões cheios de pessoas e os jogavam contra prédios cheios de pessoas no mundo da minha avó, mesmo que certamente fizessem outras barbaridades.
O que acontece é isso, caros e estimados leitores. A humanidade vem se aperfeiçoando desde que começou a domesticar gramíneas e inventar cidades. Ela criou o teatro grego, a arquitetura romana, a cerveja, as catedrais, o teatro shakespeareano, a música sinfônica, o mais pesado do que o ar, o boteco de esquina e a televisão, juntamente com a antena e o bombril. Ela criou o bronze, o aço, o arco composto, o estribo, a pólvora, o canhão, o muro, a invasão do muro, a metralhadora, o gás mostarda; a bomba atômica e a testou em Hiroshima e Nagasaki, o bombardeio incendiário e o testou em Hamburgo e Dresden; ela inventou Auschwitz e o napalm. A cada avanço de uma bondade, um avanço na maldade, e assim a gente vem se equilibrando sobre o planeta, desde sempre. O dia 11 de setembro foi um passo adiante no avanço da maldade e quem estava em Nova York mais do que entendeu, sentiu. Eu andava pela rua, num dia absurdamente azul e com ar frio e sentia a maldade descendo do céu na forma de poeira (Grifo meu, Carlos Wagner). A gente olhava ao redor e via pessoas subindo cobertas de entulho caído dos céus. Os americanos inventaram o arranha-céu, e dessa vez o céu se abriu e jogou tudo lá de cima aqui em baixo, pessoas inclusive, bombeiros que tinham subido lá para salvar pessoas, inclusive. Houve muita morte naquele dia, e isso se sente, caros leitores.
Eu fui para um encontro de amigos escritores, estava em um hotelzinho na Union Square, a uns 3 quilômetros das torres. Acordei de uma festa, com dor de cabeça e sem saber de nada. Não vi os aviões atingindo as torres, não teria sido possível de onde eu estava. Vi as pessoas subindo a avenida, os caminhões de bombeiros cobertos de pó, tentei ir até o local, porque jornalista é assim: gente corre pra longe, eles correm pra perto. Mas a área estava isolada, e a verdade é que ninguém sabia o que iria acontecer. Ninguém sabia se eram mesmo dois aviões ou haveria mais caindo sobre a cidade. Ninguém sabia se o ataque era aquele ou haveria mais maldade. Nessas horas, a gente simplesmente não sabe e não entende.
O que eu vi foi uma cidade reagindo com uma calma invejável. Eu gostaria de sentir que seríamos capazes da mesma compostura numa hora dessas. Minha avó Jovita esperaria isso de nós, não sei se a atenderíamos. No dia 11 as pessoas ainda estavam em choque, mas um choque contido, ninguém falava alto, ninguém demonstrava medo. No dia 12, com o metrô funcionando, se via uma enorme tristeza se abatendo sobre todos. Mas nenhuma agressividade, nenhuma fala de vingança, apenas uma dor coletiva. A mim, nada aconteceu. Não passei qualquer dificuldade maior, fome, frio, nada. No dia seguinte, amigos que iam para Chicago de carro me convidaram e fui junto, esperar voos para o Brasil. Eu fui um daqueles caras intocados pelo terremoto, que nem ao menos ficam no lugar para viver as consequências. No entanto, todos vivemos as consequências hoje e por muito tempo, porque as grandes maldades alteram o que chamávamos de normalidade.
Eu estava em Chicago em 2003, quando os Estados Unidos invadiram o Iraque, um desastre que não começa com o 11 de setembro, mas é viabilizado por ele. Bush e falcões se aproveitam do clima com interesses claros e que a ninguém mais atendem, meio como a Al Qaeda, mas por outros caminhos. E é nesse mundo que todos vivemos, muito em especial os iraquianos, as maiores vítimas desse jogo.
Nosso 2011 também é o ano em que a parte árabe da humanidade resolveu dar o troco com a enorme bondade da derrubada em série dos tiranos deles, mostrando que sim, eles amam a liberdade e sim, a desejam e produzem.
Nesse 11 de setembro é nisso que eu vou pensar, enquanto pego um voo, e vejam só, para a Venezuela, onde vou lançar livro, dar seminário e falar de cinema. A vida é a soma das bondades que fazemos, menos as nossas pequenas maldades. Nessa matemática todos temos a nossa parcela a contribuir, pra lá, ou pra cá. Vou tentar ser um bom ser humano nessa semana, uma pequena maneira de apagar um pouco da sensação do 11 de setembro, aquela que insinua que nós, a humanidade no atacado, e pessoas no varejo não temos jeito. Temos sim. Apenas não é tão fácil, e, por vezes, é muito difícil, só isso. Só isso, meus caros e estimados leitores, e até a volta.

segunda-feira, setembro 12, 2011

Da coleção Gítanjali do poeta Rabindranath Tagore

"De porta em porta eu andara mendigando pelo caminho da aldeia, quando o teu carro de ouro apareceu na distância como um sonho deslumbrante e eu me perguntei se seria esse o Rei de todos os reis! O carro parou onde eu estava. Teu olhar caiu sobre mim e tu desceste com um sorriso inesperadamente estendeste-me a tua mão direita e disseste: “que tens tu para me dar?”
Fiquei confuso e parei indeciso; do meu alforje então, lentamente tirei e dei-te o grão de trigo menor de todos. Mas, que grande surpresa foi a minha quando, pelo fim do dia, entornando no chão a minha sacola, encontrei entre as migalhas um grão de ouro que era o menor de todos! Amargamente chorei, lamentando não ter tido coragem de me haver dado todo a ti!"

- Da coleção Gítanjali do poeta Rabindranath Tagore.


FLOR-DE-LÓTUS

No dia em que a flor de lótus desabrochou


A minha mente vagava, e eu não a percebi.


Minha cesta estava vazia e a flor ficou esquecida.


Somente agora e novamente, uma tristeza caiu 


sobre mim.


Acordei do meu sonho sentindo o doce rastro


De um perfume no vento sul.


Essa vaga doçura fez o meu coração doer de 


saudade.


Pareceu-me ser o sopro ardente no verão, 


procurando completar-se.


Eu não sabia então que a flor estava tão perto de 


mim


Que ela era minha, e que essa perfeita doçura


Tinha desabrochado no fundo do meu coração.


Tagore

domingo, setembro 11, 2011

O cadinho e peneiras...


"O livro de Mirdad" 


 Mikail Naymy


Cadinho e Peneiras.

 


A Palavra de Deus e do homem.


A Palavra de Deus é um cadinho.




O que ela cria, derrete e funde em todo, nada aceitando como valioso, nada rejeitando como sem valor.
Possuindo o Espírito de Compreensão, sabe muito bem que ela e a sua criação constituem um todo; que rejeitar uma é rejeitar tudo; que rejeitar o todo é rejeitar-se a si mesmo. Conseqüentemente, ela tem para sempre o mesmo objetivo e o mesmo sentido. 


Entrementes, é como uma peneira a palavra do Homem. O que ela cria, prende e expulsa. Está sempre tornando isto como amigo e expulsando aquilo como inimigo. Mas, freqüentemente, o amigo de ontem torna-se o inimigo de hoje; o inimigo de hoje, o amigo de amanhã.


E assim se desencadeia a cruel inútil guerra do Homem contra si mesmo. Tudo porque falta ao Homem o Espírito Santo, o único que pode fazê-lo compreender que ele e a sua criatura são uma e a mesma coisa; que expulsar o adversário é expulsar o amigo, pois ambas as palavras — “adversário” e “amigo” — são criações de sua palavra — de seu eu.


Aquilo de que não gostais e atirais fora como sendo mau, é certamente apanhado por alguém ou algo como sendo bom. Pode acaso ser, ao mesmo tempo, duas coisas que se excluam? Ela não é nem uma coisa nem outra, foi o vosso eu que a fez má; outro eu a fez boa.


Não vos disse que aquele que pode criar pode também destruir? Tal como criastes um inimigo, podeis destruí-lo e tornar a criá-lo como amigo. 


Para isso, o vosso EU precisa de um cadinho. Para isso necessitais ter o Espírito de Compreensão.


Por isso vos digo que se orais por algo, orai emprimeiro e último lugar, pedindo Compreensão. Nunca sejais peneiradores, meus companheiros, pois a Palavra de Deus é Vida e a Vida é o cadinho no qual tudo se faz uno e indivisível; tudo fica em perfeito equilíbrio e tudo é digno de seu autor — a Triunidade Santa.


Quanto mais digno deve ser de ti!


Nunca sejais peneiradores, meus companheiros, e tereis uma tão imensa estatura, tão onipenetrante e tão oniabrangedara que não haverá peneiras que vos possam conter.


Nunca sejais peneiradores, meus companheiros; procurai em primeiro lugar o conhecimento d’A Palavra para que possais conhecer a vossa própria palavra. E quando souberdes a vossa palavra laçareis ao fogo todas as vossas peneiras pois a vossa palavra e a de Deus são a mesma, somente que a vossa ainda está sob os véus.


Mirdad vos pede que jogueis fora os véus.


A Palavra de Deus é o Tempo e o Espaço, não medidos. Houve acaso algum tempo em que não estivésseis com Deus? E há algum lugar em que não estejais em Deus? Por que acorrentais então a eternidade com horas e com estações? E por que encerrais o Espaço em polegadas e milhas?


A Palavra de Deus é Vida não nascida e, portanto, imortal.

Todos novos em Capetinga

Todos novos em Capetinga
Olha aí o pessoal lá de antes...

O lobo da estepe - Hermann Hesse

  • O lobo da estepe define minha personalidade de buscador

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